Canceriano (29/04/2025)

Dentro da minha concha,
cabem poucas pessoas.
Dentro da minha concha,
poucas coisas cabem.

Dentro da minha concha,
só eu e o essencial.
Dentro da minha concha,
só eu e o meu ideal.

Sempre carrego comigo
meu mini modesto lugar.
Sempre carrego comigo
meu mundo, meu honesto lar.

O mundo invade o meu canto,
meu canto me salva do mundo.
Todos invadem essa solidão,
minha mais fiel companheira.

Coisas antigas (27/04/2025)

As coisas não são antigas

Até que você as conheça.

Aquilo que lhe é inédito

É a real novidade.


As coisas não são antigas

Até que você as feneça.

Por isso, sempre dê crédito

Àquilo que tem qualidade.


As coisas não são antigas

Enquanto as tem na cabeça.

Aquilo que está no recôndito

É o que traz felicidade.

Mais eu me apaixono (26/04/2025)

Estamos juntos há tempos milhares,
sempre juntos, para o que der e vier.
Quanto mais eu conheço outras mulheres,
mais eu me apaixono pela minha mulher.
 
Por mais que tenhamos diferentes humores,
cuidamos um do outro, para o que der e vier.
Quanto mais eu conheço outras mulheres,
mais eu me apaixono pela minha mulher.
 
A vida nos mostrou que, apesar de calores e amores,
sentimento é compreensão e doação, para o que der e vier.
 
Quanto mais eu conheço outras mulheres,
mais eu me apaixono pela minha mulher.

Nôzinho (23/04/2025)

Nôzinho come banana,
Nôzinho come melão.
Nôzinho vem fazer nana
pertinho do meu coração.

Nôzinho, gatinho sapeca.
Nôzinho, gatinho amado.
Agarra firme a peteca,
agarra o nó do calçado.

Nôzinho, floquinho de neve.
Nôzinho, bolinha de pelo.
Que o tempo nunca te leve,
escuta aqui o meu apelo.

Versos de varde (20/04/2025)

Eu adoro livros de bolso!  

Porque a minha casa é de bolso,  

a minha vida é de bolso...  


Mas...  

não adianta eu ficar aqui  

fazendo estes versos de varde.  


Aliás,  

nem existe "de varde".  

Li num livro  

que o correto é "debalde".  


Só que "debalde"  

não cabe neste poema.  

O balde enche demais  

e este poema é vazio.  


E, além do mais,  

o "de varde" é tão correto  

quanto a minha vida vazia.  


Estou cheio! 

A arte de versejar (13/04/2025)

A arte de versejar,
como posso explicar,
é se reorganizar
e se ressignificar.

É uma forma de catarse,
de, quem sabe, expressar-se,
de amar-se, de doar-se
e, também, de explicar-se.

É abrir o coração e a mente
para toda e qualquer gente
que de arte um tanto entende
e se entreter pretende.

Controversa (10/04/2025)

Ela sempre lembrava

do que devia esquecer

Ela sempre esquecia

do que devia lembrar


Ela sempre sorria

quando devia chorar

Ela sempre chorava

quando devia sorrir


Ela sempre buscava

o que devia evitar

Ela sempre evitava

o que devia buscar


Estava sempre acordada

quando devia dormir

Estava sempre dormindo

quando devia acordar

O demônio tenta (09/04/2025)

O demônio provoca,

instiga.

O desejo ele evoca

e o caos abriga.


A intriga

o demônio invoca.

Ele futrica

e a sociedade choca.


Ele atiça a tormenta

e o mal prossegue.

O demônio tenta

e às vezes consegue.

O Fantástico Circo Pau-Brasil (04/03/2025)

O Fantástico Circo Pau-Brasil

conta com patéticos palhaços

que driblam a humilhação diária

com pura bandalha e malandragem.


Há ainda alardeadas marionetes

que idolatram o atroz titereiro

e que, acostumadas à manipulação,

agarram-se aos cordéis umbilicais.


O espetáculo é visto rotineiramente

por um pequeno e lúcido público

que não gosta daquilo que vê

e reclama do preço dos lanches,

mas patrocina e aplaude ternamente.

Restauração (28/01/2025)

Depois de tantos anos de convivência,

nosso romance tem perdido a efervescência.

Mas é possível perceber a sua potência

quando sinto a sua doída ausência.


Minhas reclamações, meu estado nervoso,

são sinais da mais pura insegurança.

Minhas reinações, meu andar ansioso,

é um volátil voltar a ser criança.


O nosso silêncio diz muito!

Diz o que não precisa ser dito.

Pois, se não há diálogo fortuito,

basta curtir o sentimento bendito.


Sinto-me hoje como seu pai,

ou seu irmão mais próximo;

talvez o seu melhor amigo –

mais do que o companheiro.


Pois, para todo o “ai”,

para a falta de dinheiro,

ou quando nada está ótimo,

você é o meu melhor abrigo.


Você, que nunca mais será uma estranha,

que está encravada nas minhas entranhas,

qual tesouro bem protegido,

no futuro e nos tempos idos.


Espero que haja calor depois do inverno,

que haja harmonia depois do inferno,

pois não há crise que para sempre dure

nem ferida que o tempo não cure.